quinta-feira, 4 de agosto de 2016

A Lava-Jato e o Vice-Almirante

Mauro Santayana *
Em uma sentença que chama a atenção pela severidade e a ausência de proporcionalidade, o ex-presidente da Eletronuclear, Vice-Almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, foi condenado, ontem, por um juiz do Rio de Janeiro – com uma decisão que atingiu também a sua filha – a 43 anos de prisão por crimes supostamente cometidos durante as obras da usina nuclear de Angra 3.

O Vice-Almirante Othon é um dos maiores cientistas brasileiros, um dos principais responsáveis pelo programa de enriquecimento de urânio da Marinha, que levou o Brasil, há 15 dias, a fazer a sua primeira venda desse elemento químico – usado como combustível para reatores nucleares – para o exterior, para uma empresa pertencente ao governo argentino.

Em qualquer nação do mundo, principalmente nos EUA – país que, justamente por ser brasileiro, e não norte-americano, o teria espionado, “plantando” um homem da CIA ao lado do seu apartamento – o Vice-Almirante Othon estaria sendo homenageado, provavelmente com uma medalha do Congresso ou da Casa Branca, por serviços de caráter estratégico, prestados ao fortalecimento da Nação e ao seu desenvolvimento.

No Brasil de Itamar Franco – um homem íntegro e nacionalista, que cometeu a besteira de confiar em quem não devia e abriu a Caixa de Pandora da tragédia neoliberal dos anos 1990, ao apoiar para sua sucessão um cidadão em cujo governo, segundo o Banco Mundial, o PIB e a renda per capita recuaram e a dívida pública duplicou, deixando ainda um papagaio, com o FMI, de 40 bilhões de dólares – o Vice-Almirante Othon recebeu, em 1994, da Presidência da República, a Grã Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico.

Ele também é Comendador da Ordem do Mérito Naval; da Ordem do Mérito Militar; da Ordem do Mérito Aeronáutico; da Ordem do Mérito das Forças Armadas; da Medalha do Mérito Tamandaré; e recebeu, além disso, a Medalha do Pacificador, a Medalha do Mérito Santos-Dumont e a Medalha Militar de Ouro.

No Brasil kafquianamente imbecilizado, midiotizado, manipulado, plutocratizado, deturpado, moralmente, da atualidade, que caminha a passos largos para a instalação de um governo – de fato – de exceção e fascista – e, ainda por cima, entreguista e antinacional – a partir de 2018, ele está sendo condenado por uma justiça em que muitos membros recebem acima do teto constitucional, perseguem jornais que os denunciam, e podem fazer palestras remuneradas sem ter que declarar quanto estão recebendo, conforme resolução do CNJ divulgada no início deste mês de julho.

Com uma maioria de patriotas, nacionalistas, legalistas, constitucionalistas, os militares brasileiros têm suportado em silêncio digno a interrupção e as ameaças que pairam, como aves de rapina, sobre numerosos projetos de defesa que tiveram início na última década e sobre as empresas responsáveis por eles, como o dos submergíveis convencionais e o do submarino atômico – de cujo desenvolvimento do reator já participou o próprio Vice-Almirante Othon – sob responsabilidade da Odebrecht, um dos grupos mais prejudicados e perseguidos pela Operação Lava-Jato, que já teve que demitir mais de 120.000 pessoas no último ano, também encarregada, por meio da Mectron, da construção, em conjunto com a Denel sul-africana, do míssil A-Darter que irá armar os novos caças Gripen NG-BR, que estão sendo – também por iniciativa dos dois últimos governos – desenvolvidos com a Suécia por intermédio da SAAB.

Tudo isso, em nome de um pseudocombate à corrupção hipócrita, ególatra, espetaculoso e burro, em que, para descobrir supostos desvios de um ou dois por cento em programas estratégicos de bilhões de dólares, condena-se ao sucateamento, atraso ou interrupção – como era o caso, há anos, das obras de Angra 3 antes de sua retomada justamente pelo Vice-Almirante Othon – os outros 97% dos projetos, sem nenhuma consideração pela aritmética, a lógica, o bom senso, a estratégia nacional, o fortalecimento ou o desenvolvimento brasileiros.

Isso, ainda, para vender, falsa e mendazmente, com a cumplicidade de uma parcela da mídia irresponsável, apátrida, estúpida e venal, a tese de que se estaria “consertando” o país, quando o que se está fazendo é jogar o bebê pela janela junto com a água do banho, e matando a boiada inteira para exterminar meia dúzia de carrapatos, no contexto de um projeto de endeusamento de um personagem constantemente incensado por uma potência estrangeira – justamente aquela que espionou o próprio Vice-Almirante Othon – quando se sabe que para prender corruptos não era preciso arrebentar com as maiores companhias de engenharia do país, como se está arrebentando, nem com os principais projetos bélicos e de infraestrutura em andamento, ou com a Estratégia Nacional de Defesa, arduamente erguida nos últimos anos, ou com um conjunto de programas do qual toma parte, ainda, o Astros 2020 da Avibras; a nova família de fuzis de assalto IA-2, da IMBEL; o Cargueiro Militar multipropósito KC-390 da Embraer; a nova linha de radares SABER; os 1050 novos tanques Guarani, desenhados pelo Departamento de Engenharia do Exército, até algum tempo atrás – ao que se saiba – ainda em construção pela IVECO; os novos navios de superfície da Marinha; ou o novo satélite de comunicações que atenderá às Forças Armadas.

Os alegados 4 milhões de reais em “propina” eventualmente pagos em consultoria ao Vice-Almirante Othon – uma das razões de sua condenação a mais de 40 anos de prisão – seriam, caso sejam comprovados, uma migalha diante do que ele mereceria receber, em um país mais patriótico e menos hipócrita, como cientista e como compatriota, e uma quantia irrisória, se formos considerar, por exemplo, o preço de um apartamento de quatro quartos em Higienópolis, em São Paulo – há os que são vendidos a preço de “ocasião” - ou o fato de ratos como Eduardo Cunha, Nestor Cerveró e Paulo Roberto Costa, com dezenas de milhões de dólares na Suíça, terem sido soltos pelo Juiz Sérgio Moro e, tranquilos, estarem em casa neste momento.

Só no Brasil, também, um cientista desse porte é enxovalhado, como o Vice-almirante Othon está sendo, nas redes sociais, por um bando de energúmenos, ignorantes, preconceituosos e estúpidos que não tem a menor ideia do que está ocorrendo no país, e que pensam mais com o intestino do que com a cabeça.

Só não dá para dizer que dá vergonha de ser brasileiro porque o Brasil é maior que esta corja tosca, antinacional, vira-lata, manipulada e ignara, e porque mesmo que os cães ladrem a caravana passará, finalmente, um dia, altaneira e impávida.

Como disse Cazuza, o tempo não pára.

Aos que estão arrebentando com a Pátria – e com as suas armas, seus heróis e seus exemplos – sacrificando-os no altar de suas inconfessáveis, imediatistas e rasteiras ambições, sobrará o inexorável e implacável julgamento da História.

* o autor é jornalista
Publicado originalmente em
http://www.maurosantayana.com/2016/08/a-lava-jato-e-o-vice-almirante.html


COMENTÁRIOS DO BLOGUEIRO:
A quem interessa a condenação do Vice-Almirante Othon? Aos que pretendem privatizar o programa de energia nuclear brasileiro? Historicamente o Vice-Almirante Othon demonstrou ser absolutamente contra essa entrega aos gringos.
Outra conclusão: proferir palestras remuneradas ou fazer consultoria especializada neste país desperta a inveja e cobiça das pessoas, especialmente juízes, estão aí os Dirceus e Santanas, presos e condenados por serem bem sucedidos. Na reta final desse ódio jurídico, seletivo, conveniente e oportunista, ainda tem pela frente Lula e alguns outros, pois os antecedentes explicitados foram meros meios que justificarão os fins.
Sinto imensa vergonha de ser brasileiro. Lamentavelmente não sou o primeiro nem o último a ter esse sentimento de frustração.

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