quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Crianças de hoje e de ontem


Guilherme Cardoso 
Quanta pena eu tenho das crianças de hoje. Pensam que têm tudo e na verdade não têm nada. Têm celulares, smartphones, computadores, tabletes e games, e não sabem o prazer de brincar na rua, jogar Queimada, Pegador, praticar um jogo como o Bente Altas. Nem sabem que jogo é esse! São crianças na idade, adultos no agir e pensar. São meninos e meninas na aparência, que se vestem, se pintam e se comportam como papais e mamães.

São crianças resguardadas e protegidas de tudo e de todos. E tem que ser assim! Há perigos por todos os lados. Na rua, nas escolas, nos shoppings, até dentro de casa. São cuidados para não cair, atenção aos pivetes nas praças, alertas com as drogas oferecidas nos carrinhos de balas, vigilância com os pedófilos na internet e nas redes sociais.

Vejo meus netos, coitados, oito anos de idade. Escutam o avô contar casos do tempo em que se amarrava cachorro com linguiça, não acreditam, acham que é mentira ou exagero lembrar que quando garoto, quase não havia ladrão, o medo que a gente tinha era de assombração, mula sem cabeça, lobisomem.

Escola não era tempo integral, só pela manhã, a tarde ficava livre para brincar, fazer arte nos dois sentidos da palavra: invenção e molecagem.

Brinquedos a gente inventava, não comprava. Caminhões, casinhas, bonecos e bonecas, soldadinhos, eram feitos de argila, carretéis de linha, papelão ou madeira. Com madeira, pregos, martelo, serrote e duas rolimãs, se faziam patinete e carrinho de mão, e sem medo descia ladeira abaixo, pura terra, salve-se quem puder.

Futebol era jogado na rua ou campinhos de terra improvisados, com latas ou pedras marcando o lugar do gol. A bola ou era de pano, de borracha, e algumas vezes bola de couro, oficial, número 5, toda costurada à mão e com bico de encher, trazida pelo menino mais rico da rua. E rico naquele tempo era o pai que tinha emprego fixo, funcionário público, empregado dos Correios ou da Rede Ferroviária. E nem ganhava tão bem.

Televisão estava começando, rádio quase todo mundo tinha, o que se ouvia era a Hora do Fazendeiro, depois a Voz do Brasil, e mais tarde os programas de auditório da Rádio Nacional do Rio de Janeiro e os humorísticos da rádio Mayrink Veiga. Depois vieram as novelas radiofônicas, O Direito de Nascer e Jerônimo, o Herói do Sertão. E a gente sonhava.

Eu ficava na rua a tarde inteira. Andava descalço, tênis não existia, sapato era para ir à missa e à escola, a gente só almoçava e jantava, não tinha lanches, nem iogurte nos intervalos. Quando brigava na rua, apanhava de novo em casa, e se machucasse mais sério, perna quebrada, corte na testa, atendimento era só no Pronto Socorro Policial na Rua dos Otoni em Santa Efigênia. Não havia clínicas, postos, nem Planos de Saúde.

A gente era criança e não tinha nada. Mas como era feliz!

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