quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Proibida a entrada de agrônomo

Richard Jakubaszko
A placa estava lá, na porteira da fazenda, ameaçadora: “Proibida a entrada de agrônomo”. Quem a lia ficava intrigado, e intimamente se perguntava o que acontecera, afinal de contas, para tal proibição estar lá dependurada. 
Essa é uma história já antiga, tida como verdadeira, e foi contada pelo advogado e especialista cartorial Dr. Antônio Albergaria Pereira, cujo irmão, já falecido, meteorologista do Instituto Agronômico de Campinas, também conhecido como Dr. Albergaria, que relatava sobre o desatino de um fazendeiro lá do norte do Paraná que não tinha grandes estudos, mas era proprietário de uma bela e rentável propriedade, onde criava gado de corte e fazia um pouco de agricultura para servir de alimento aos animais, vendendo ao mercado o que sobrava.

A placa deu o que falar, na cidade e na região. Consta que teve até passeata contra a tal placa, com protestos e discursos de agrônomos da região, acompanhados de amigos, parentes e simpatizantes da causa. Esses atos de protestos foram feitos na porteira da fazenda, ao pé da tal placa, mas o fazendeiro não apareceu para se explicar ou justificar. A sede da fazenda ficava distante da porteira, as reclamações pareciam não adiantar. 
Os ouvintes dos lamentos se resumiam a passarinhos que passavam e aos bois que estavam no pasto vizinho à porteira, de tão bucólico e tranqüilo que era a região. Ninguém se atrevia a subir lá e retirar “a mardita da placa”, como já era chamado o aviso. Até porque, mais ou menos ao lado da tal placa tinha outra, mais ameaçadora: “cuidado, touro muito bravo”. Por conta de doença grave e inesperada o fazendeiro foi obrigado a colocar a fazenda sob os cuidados de um sobrinho, até porque não tivera filhos.

Esse sobrinho, seu preferido entre muitos outros, tivera estudos financiados pelo fazendeiro e formara-se em agronomia, mas não conseguia trabalho na região. O tio, em decorrência da doença, hospitalizou-se para sofrer delicada cirurgia e seguir tratamento dado pelos médicos. Deixou a fazenda aos cuidados do sobrinho, em quem tinha alta confiança como pessoa, mas desconhecia seus talentos profissionais.

Muitos meses depois, já restabelecido de sua doença, o fazendeiro retornou à fazenda, propriedade, aliás, que pretendia deixar como herança ao sobrinho predileto, intenção que inclusive já havia sido colocada em prática no testamento que mandou redigir e assinou perante testemunhas quando hospitalizado. Na administração da fazenda, o jovem sobrinho cometera muitos tropeços administrativos e inovações técnicas apressadas, quase levando-a à bancarrota, além de assumir postura nada elogiável em relação aos proventos que advinham da propriedade, e de efetuar as compras mais disparatadas possíveis, atitudes que deixaram o tio em situação embaraçosa e com diversas dívidas.

Arrependido de sua decisão, o tio retomou a administração e posse de fato da propriedade, expulsou o sobrinho da fazenda, depois de fazer um longo e crítico discurso, e cancelou o testamento. Por isso a placa foi afixada na porteira da fazenda com aqueles dizeres, mensagem dirigida apenas ao sobrinho ingrato e incompetente, mas que a classe agronômica entendia como ofensiva aos dignos e dedicados profissionais da categoria.

Contam amigos do fazendeiro que ele deu-se por feliz de não ter ido em frente com o que havia se proposto, de efetuar doação em vida do patrimônio ao sobrinho, conforme planejara, pois nesse caso poderia não haver volta. 
O fazendeiro dessa ilustrativa história havia sido alertado por parentes, mas não dera ouvidos ao que considerava fofoca e inveja, e via nisso um certo “interesse” de outros parentes.

Certo dia, os agrônomos se armaram de um trio elétrico e foram logo cedo lá para a “fazenda da placa mardita”, como já ficara conhecida a propriedade. E fizeram um barulho infernal. Dessa feita não houve jeito de não reparar na barulheira dos agrônomos, que exigiam, enfurecidos, a imediata retirada da placa, sob ameaça de processo judicial. O fazendeiro apareceu e explicou aos reclamantes que “o aviso tá no singular”, não é válido para todos os agrônomos, e “tem endereço certo para um único agrônomo”, que já estava informado verbalmente por ele da proibição, e que “a placa está ali na porteira para o caso dele se esquecer do aviso que eu dei”.

Consta que a placa ficou lá, dependurada, "exibida", e ameaçadora, por muitos e muitos anos.

O texto acima foi extraído e adaptado do livro “Meu filho, um dia tudo isso será teu”, a ser lançado em breve, e que trata de como transmitir vocação e aptidão para o trabalho na área rural, além de contar segredos de como fazer a transmissão de patrimônios aos herdeiros.

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